História das Seqüências e Séries |
Zenão de Eléa (490–425 a.C.) escreveu um livro com 40 paradoxos relativos ao contínuo e ao infinito. Pelo menos quatro dos paradoxos influenciaram o desenvolvimento da matemática para explicar os fenômenos relevantes. Infelizmente, o livro não sobreviveu até os tempos modernos, assim conhecemos estes paradoxos a partir de outras fontes. Os paradoxos de Zenão sobre o movimento desconcertaram matemáticos por séculos. No final eles envolvem a soma de um número infinito de termos positivos a um número finito, o qual é a essência da convergência de uma série infinita de números. Vários matemáticos contribuíram para o entendimento das propriedades de seqüências e séries. Este ensaio destaca as contribuições de alguns daqueles matemáticos que estudaram seqüências e séries.
Zenão não foi o único matemático da antiguidade a trabalhar com seqüências. Vários dos matemáticos gregos da antiguidade usaram seu método de exaustão (um argumento seqüencial) para mediar áreas de figuras e regiões. Usando sua técnica refinada de raciocínio chamada de “método”, Arquimedes (287– 212 a.C.) alcançou vários resultados importantes envolvendo áreas e volumes de várias figuras e sólidos. Na verdade, ele construiu vários exemplos e tentou explicar como somas infinitas poderiam ter resultados finitos. Dentre seus vários resultados estava que a área sob um arco parabólico é sempre dois terços da base vezes a altura. Seu trabalho não foi tão completo ou rigoroso, como daqueles matemáticos que vieram depois e desenvolveram seqüências e séries como Newton e Leibniz, mas foi tão impressionante quanto. Embora Arquimedes tenha sido obstruído pela falta de precisão e notação eficiente, foi capaz de descobrir muitos dos elementos da análise moderna de seqüências e séries.
O próximo contribuinte importante para esta área da matemática foi Fibonacci (1170–1240). Ele descobriu uma seqüência de inteiros na qual cada número é igual à soma dos dois antecessores (1,1,2,3,5,8,…), introduzindo-a em termos de modelagem de uma população reprodutiva de coelhos. Esta seqüência tem muitas propriedades curiosas e interessantes e continua sendo aplicada em várias áreas da matemática moderna e ciência. Durante o mesmo período, astrônomos chineses desenvolveram técnicas numéricas para analisar resultados experimentais. Durante os séculos 13 e 14, matemáticos chineses usaram a idéia de diferenças finitas para analisar tendências em seus dados. Hoje, métodos como os deles são usados para entender o comportamento a longo prazo e os limites de seqüências infinitas. Este trabalho inicial na Ásia levou a mais investigação e análise de várias progressões e séries mas teve pouca influência sobre os matemáticos europeus.
Oresme (1325–1382) estudou taxas de variação, como velocidade e aceleração, usando uma aproximação seqüencial. Seu principal trabalho, De configurationibus, foi o primeiro a apresentar gráficos de velocidade. O argumento que usamos para mostrar a divergência da série harmônica foi inventado por Oresme em sua publicação. Duzentos anos depois, Stevin (1548–1620) avançou a matemática providenciando uma simbologia mais fácil de se compreender. Ele entendeu os conceitos físicos e matemáticos da aceleração devido à gravidade. Somou séries e analisou seqüências, mas parou um pouco antes de definir ou explicar limites e convergência. O contemporâneo de Stevin, Galileu (1564–1642), aplicou matemática às ciências especialmente astronomia. Baseado no seu estudo de Arquimedes, Galileu melhorou a compreensão de hidrostática, desenvolveu os resultados para o movimento em queda livre sob a ação da gravidade e os movimentos dos planetas. Até sugeriu que poderia existir uma terceira propriedade entre o finito e o infinito. Galileu deixou seus sucessores com conselhos e desafios encontrados nas duas citações a seguir:
Onde os sentidos falham, a razão deve entrar.
Infinitos e indivisíveis transcendem nosso entendimento finito, o primeiro por conta de sua magnitude, o segundo pela sua pequenez; imagine o que eles são quando combinados.
À medida que o desenvolvimento do cálculo foi tomando forma, o progresso no entendimento de séries infinitas teve um papel no desenvolvimento do cálculo diferencial e integral. Pascal (1623–1662) era fascinado pelos resultados impressionantes que vinham das somas infinitas, mas era confundido pelo seu conceito. Para ele, o infinito era alguma coisa para admirar, mas impossível de entender. Pascal preferiu a abordagem geométrica de St. Vincent (1584–1667) para séries e sua convergência em vez da nova abordagem analítica de Fermat (1601–1665) e Descartes (1596–1650) que não conseguia visualizar ou entender. Apesar da limitação de Pascal para entender séries, ele, junto com Descartes e Fermat, usou cálculos com séries nas contribuições aos fundamentos do cálculo diferencial e integral.
Até a metade do século 17, matemáticos tinham desenvolvido e analisado séries de números. O tempo tinha chegado para investigar seqüências e séries de funções. Ambos Newton (1642–1727) e Leibniz (1646–1716) desenvolveram representações de séries para funções. Usando métodos algébricos e geométricos, Newton calculou as séries para as funções trigonométricas sen(x) e cos(x) e para a função exponencial. Estes resultados são encontrados nos trabalhos de Newton intitulados Method of Fluxions and Infinite Series e Analysis with Infinite Series. Newton utilizou séries para desenvolver muitos resultados de cálculo, tais como área, comprimento de arco e volumes. Leibniz somou seqüências de recíprocas de números poligonais e, seguindo o trabalho de St. Vincent, somou e analisou várias seqüências geométricas. Leibniz usou uma abordagem seqüencial de valores infinitamente próximos para explicar o conceito de limite. Embora nunca tenha pensado na derivada como um limite, descobriu muitos dos resultados que agora estudamos em cálculo usando limites.
Brook Taylor (1685–1731) não foi o primeiro a inventar a estrutura e o processo que chamamos de série de Taylor, e a série de Maclaurin não foi desenvolvida por Colin Maclaurin (1698–1746). James Gregory (1638–1675) estava trabalhando com séries de Taylor quando Taylor tinha apenas alguns anos de idade. Gregory também publicou a série de Maclaurin para muitas funções trigonométricas antes que Maclaurin tivesse nascido. Taylor não conhecia o trabalho de Gregory quando publicou seu livro Methodus incrementorum directa et inversa, o qual continha o que chamamos agora de série de Taylor. Ele tinha desenvolvido independentemente um método baseado em cálculo para gerar representações de funções em séries. Posteriormente, Maclaurin citou um trabalho de Taylor em um livro de cálculo que escreveu em 1742. O livro de Maclaurin popularizou representações de funções em séries, e embora Maclaurin nunca tenha afirmado que as tinha descoberto, a série de Taylor centrada em a = 0 tornou-se posteriormente conhecida como série de Maclaurin. Johann Bernoulli (1667–1748) também fez uma descoberta independente do teorema de Taylor.
Euler (1707–1783) usou freqüentemente séries infinitas em seu trabalho para desenvolver novos métodos ou para modelar problemas aplicados. Publicou Mechanica em 1736, onde aplicou sistematicamente o cálculo à mecânica e desenvolveu novos métodos para resolver equações diferenciais usando séries de potências. Estabeleceu a notação de somatório que usamos hoje, usando sigma para o símbolo da soma. D’Alembert (1717–1783) escreveu cinco artigos lidando com métodos para integrar equações diferenciais. Embora tenha recebido pouca educação científica formal, é claro que ele conhecia os trabalhos de Newton, L’Hospital e dos Bernoullis. D’Alembert publicou muitos trabalhos sobre matemática e física matemática, culminado com seu trabalho principal, Traité de dynamique. Considerou a derivada como um limite da diferença de quocientes, o que o colocou à frente dos seus pares no entendimento do cálculo. Também desenvolveu o teste da razão para determinar a convergência de muitas séries. Através do trabalho de D’Alembert, a natureza da pesquisa sobre séries estava mudando de cálculos práticos para uma fundamentação mais teórica.
Lagrange (1736–1813) estendeu o trabalho de Euler nas equações de movimento e o entendimento da energia potencial. Publicou Mécanique analytique (1787), que aplicava cálculo ao movimento de objetos. O maior trabalho de Lagrange foi na teoria e aplicação do cálculo. Ele sentiu que a série de Taylor desempenhava um papel fundamental no entendimento do cálculo, embora ainda evitasse o limite e as propriedades de convergência de seqüências e séries. Bolzano (1781-1848) confrontou este assunto, apontando que a convergência era importante para entender e usar séries. Tentou explicar convergência associando-a com a idéia de subconjuntos limitados. Bolzano acreditava no método de Lagrange para usar séries de Taylor como a base para o cálculo. Fourier (1768–1830) fez contribuição ao estudo e cálculo da difusão de calor e à solução de equações diferenciais. Théorie analytique de la chaleur (A Teoria Analítica do Calor, 1822) contém uso extenso de séries consistindo de funções trigonométricas que hoje chamamos de séries de Fourier. Apesar disso, contribuiu muito pouco para a teoria destas séries, as quais eram conhecidas, muito antes, por Euler, Daniel Bernoulli e Lagrange.
Finalmente, a comunidade matemática foi motivada a estabelecer fundamentos mais teóricos para as idéias de limite e convergência de seqüências e séries. Cauchy (1789-1857) foi o primeiro a definir por completo as idéias de convergência e convergência absoluta de séries infinitas. Este trabalho foi feito em conjunto com o desenvolvimento de uma análise rigorosa do cálculo. Também foi o primeiro a desenvolver uma teoria sistemática para números complexos e a transformada de Fourier para equações diferenciais. Contudo, ambos Cauchy e seu colega Niels Henrik Abel (1802–1829) ignoraram a utilidade das séries divergentes. Abel escreveu em 1828 “séries divergentes são a invenção do diabo, e é uma vergonha basear nelas qualquer demonstração”.
Runge (1856–1927) desenvolveu o método de resolução baseado em seqüências para solucionar numericamente equações diferenciais junto com M. W. Kutta (1867–1944). Seqüências e séries tornaram-se ferramentas padrão para aproximar funções e calcular resultados em computação numérica.
O matemático indiano autodidata Srinivasa Ramanujan (1887–1920) usou seqüências e séries de potências para desenvolver resultados em teoria de números. O trabalho de Ramanujan era teórico e produziu numerosos resultados importantes usados por matemáticos no século 20. Seus colaboradores britânicos Godfrey Harold (G.H.) Hardy (1877–1947) e John Littlewood (1885–1977) usaram seu conhecimento de séries para produzir avanços importantes em teoria de números e estenderam a utilidade das séries para muitas áreas da matemática.
Bom esforço mas ainda não consegui entrar dentro da discussão, e até andei a ler outras coisas sobre a falsificabilidade.
Vou fazer um comentário longo e com pouco interesse para este debate, é só para dizer umas coisas sobre ciência.
Uma coisa que para mim chega a ser irritante em todos estes tipos de discussão é a de se dizer que as leis de Newton estão erradas! Bem, se as leis de Newton estão erradas porque é que a NASA as usa para pôr foguetões em órbita e porque é que são usadas todos os dias em muitas situações? É que nestes casos as leis de Newton tem uma precisão muito grande, e em muitos casos estão tão certas como a relatividade porque os corpos têm uma velocidade tão pequena que os efeitos relativísticos podem ser completamente desprezados porque nem existem instrumentos que consigam medir efeitos tão pequenos para velocidades pequenas.
Se as leis de Newton estão erradas todas as leis da física estão erradas! Há casos em que a relatividade também não explica certos fenómenos, ou não “casa” bem com a quântica. A maior parte, ou todas, as leis da física têm determinadas restrições e só se podem aplicar em determinados casos, como a lei de ohm que é muito dependente da temperatura.
Outra coisa que reparei é que o Desidério apresenta exemplos ciêntíficos que são mais próprios das… humanidades! Vou tentar explicar. O tipo de gases que se descobriram em Marte ou o valor da velocidade da luz não são coisas realmente muito importantes (claro que são mas eu já explico isto). O valor da velocidade da luz resulta apenas de uma medição, e também se pode medir a velocidade da luz no quartzo, ou no diamante, ou no vidro. Não são coisas muito importantes, são coisas para pôr em catálogos, tabelas, como fazem os antropólogos. A descoberta de certos gazes em Marte é a mesma coisa. Não há nenhuma teoria na física que preveja um valor para a velocidade da luz. A medição da velocidade da luz não pode estar errada, tem um erro, que já foi maior porque os instrumentos evoluem, mas é completamente impossível que amanhã alguém descubra que a velocidade da luz é de 100 km por hora. É o mesmo que descobrir que afinal o Desidério mede 10 metros em vez dos 1,75 cm (estou a faze-lo muito baixo?).
Aquilo que acho que é realmente importante em ciências como a física não são essas medidas, esse catalogar, o que é importante é a capacidade de prever sem medir. Por exemplo, alguém que queira construir um circuito electrónico para determinados fins, limita-se a fazer uns cálculos no papel, usando leis que são conhecidas e depois montar o circuito, sabendo à partida que se não cometer nenhum erro, depois de tudo montado o circuito vai funcionar. Isso é que é importante, a capacidade de prever, de calcular o que vai acontecer.
E é aí que pode estar o erro, pode descobrir-se que as leis não funcionam sobre certas condições.
Mas isto também é uma coisa banal na física e eu não percebo porque certos autores insistem tanto que os cientistas não gostam de leis novas quando há por aí montes de exemplos de fenómenos para os quais se usam várias teorias para os tentar explicar.
Aquilo que distingue as ciências como a física da psicologia, por exemplo, é a capacidade de prever e não a de medir. Se a física pode medir a velocidade da luz no vidro a psicologia pode medir o QI do Desidério, mas a física tem a capacidad de prever a velocidade da luz num vidro diferente usando as leis de Snell e a psicologia não tem essa capacidade de prever o QI de um individuo usando parâmetros como o ângulo do nariz ou a área da testa.
É aí que se pode tentar encontrar a tal definição filosófica que distinga uma ciência que tem a capacidade de prever de outra que não, como a astrologia.
Miguel Real
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O que eu tinha percebido do Popper deve estar completamente errado, e que era o seguinte: as leis da ciência servem para prever determinados fenómenos mas pode vir a descobrir-se que estão erradas, como as de Newton para velocidades próximas da da luz, e então tem que se encontar outras leis. E tinha percebido que o que ele queria dizer é que a astrologia nem sequer tem isso, que não tem leis que possam ser falsificávei porque estão sempre erradas!
Eu sei que isto pode parecer cómico a um filósofo profissional, demasiado simplório, mas já agora ficam a saber como é que alguém ligado às ciências pensa sobre estas coisas.
Desculpem o comentário exageradamente longo e que não acrescenta nada, julgo.
Vou continuar atento e esforçar-me mais um pouco para perceber a vossa ideia da ciência.
Miguel Real
Responder
Desidério, além do que referes no teu diálogo, poderíamos ainda levantar uma objecção mais geral e mais básica à motivação que está na origem da ideia de falsificabilidade.
Popper rejeita a indução como base do raciocínio científico porque a indução, ao contrário do que muitos pareciam pensar, nunca pode garantir que uma dada teoria é verdadeira. Venha de lá o número de corvos negros que quisermos: isso nunca poderá verificar a teoria de que todos os corvos são negros. Por isso, acha que a indução é cientificamente decepcionante e, com ela, vai ao ar também a ideia de verificabilidade das teorias científicas.
Mas o que propõe em troca? Algo que nos garanta o que a indução não consegue garantir? É claro que não, pois a falsificabilidade (que recorre ao raciocínio dedutivo) também não garante seja o que for; também não garante que as teorias científicas são verdadeiras. Basicamente, a falsificabilidade encontra os mesmos limites que a indução.
Ora bolas! Ficamos onde estávamos. Na verdade, o que ele faz é trocar a ideia de probabilidade pela ideia de corroboração. Em ambos os casos estamos impedidos de tomar as teorias como verdadeiras. Em suma, que se ganha em substituir teorias provavelmente verdadeiras por teorias corroboradas? Avança-se mais depressa? Talvez, mas daí não se segue que haja algo errado na indução.
Não sei se a minha ideia ficou clara. Espero que sim.
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Caro Miguel Real,
«O que eu tinha percebido do Popper deve estar completamente errado, e que era o seguinte: as leis da ciência servem para prever determinados fenómenos mas pode vir a descobrir-se que estão erradas, como as de Newton para velocidades próximas da da luz, e então tem que se encontar outras leis. E tinha percebido que o que ele queria dizer é que a astrologia nem sequer tem isso, que não tem leis que possam ser falsificávei porque estão sempre erradas!»
Parece-me que percebeu bem a primeira parte, mas a segunda não bate bem com a primeira. Segundo Popper, a astrologia não é uma ciência por fazer previsões que estão sempre erradas. Aliás, ele aceita que muitas vezes as previsões astrológicas até possam bater certo, o que considera completamente irrelevante. O que mostra que a astrologia não é uma ciência é o facto de os astrólogos protegerem sistematicamente as suas teorias da falsificabilidade. Assim, as previsões dos astrólogos são formuladas de tal modo que tornam praticamente impossível falsificá-las, dado que eles não conseguem dizer claramente que casos possíveis a poderiam falsificar. Pelo contrário, quando surge um caso que parece contrariar a previsão do astrólogo, este imediatamente se esforça por mostrar que tal não aconteceu, recorrendo a uma série de explicações nesse sentido.
Só mais duas notas.
O Miguel fala como se os filósofos tivessem todos a mesma ideia de ciência, o que é falso. Aliás, alguns filósofos da ciência foram também físicos, biólogos, etc. (Kuhn, por exemplo, foi físico).
Finalmente, não é verdade que os filósofos em geral pensem que as leis de Newton estejam pura a simplesmente erradas. É verdade que há por aí alguma vulgata pseudo-filosófica que repete esse chavão, mas isso só muito vagamente tem que ver com filosofia da ciência. É como a ideia de que Gödel mostrou que nem na matemática há verdades, que Einstein mostrou que tudo é relativo e que Heisenberg mostrou que na ciência tudo é incerto.
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Aires, obrigado pela explicação. Eu sei que há várias correntes filosóficas e que há físico e matemáticos, por exemplo, que fizeram filosofia, até aí eu sei! Desculpe a falta de precisão.
Claro que a astrologia pode fazer previsões que podem estar certas por acaso, se eu adivinhar que para o ano o Porto vai ser campeão tenho uma grande probabilidade de acertar.
Isto faz-me lembrar que também deve ser difícil para os filósofos definir qual é a certeza de uma lei científica para se poder considerar que ela é verdadeira, porque qualquer lei da ciência está sujeita a erro, embora muitas vezes seja pequeníssimo.
O que também me faz lembrar que muitas vezes a mecânica quântica é falada como uma teoria em que só se lida com probabilidades. Isto é completamente errado, há cálculos na quântica que estão certos até muitas casas decimais, é uma das teorias mais sólidas da física, não tem nada que ver com os resultados sairem ao acaso, como muita gente parece entender. Por exemplo, é possível calcular a cor do ouro usando a quântica e obter resultados que coincidem completamente (há sempre um erro) com o resultado experimental.
A quântica preve que há um material que é mais duro que o diamante, o nitreto de carbono, que é um material que não existe na natureza e que ainda não foi sintetizado e que se anda a tentar fazer em câmaras de alta pressão. É para este tipo de coisas que as leis físicas são úteis, para prever. Mas se calhar este composto vai ter uma distância inter-atómica que não é bem bem a prevista. É aí que eu acho que será difíl dizer se a tal afirmação da quãntica é verdadeira, falsa, contingente, etc. Isso escapa-me.
Miguel Real
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Acho que uma fonte de dificuldade aqui é pensarmos intuitivamente que as “proposições” não são itens do mundo, independentes das nossas crenças. Acho que há uma tendência a dar às proposições o estatuto de crenças. Assim, confundimos o “poder estar enganado” ou “ter muita certeza”, com a questão da contingência ou necessidade das proposições.
Estas coisas ficam mais claras quando nos habituamos a separar duas áreas que tendemos a confundir frequentemente, e acho que é o caso do Miguel: o epistémico (o estado do nosso conhecimento, as nossas crenças, ideias, etc) e o metafísico (o modo como as coisas são independentemente das nossas crenças). Considere-se a afirmação “Há outros planetas com vida inteligente” – mesmo que nunca possamos saber a verdade acerca desta proposição, ela é, neste momento, ou verdadeira ou falsa. A proposição “a água é H2O” já era verdadeira no tempo de Guilherme de Ockham. O facto de ninguém a ter formulado ou o estado geral das crenças das pessoas na época é outra coisa. A frase “a água é H2O” exprime uma proposição. Embora a linguagem usada para formular a proposição seja uma criação nossa, a proposição em si é um item do mundo, independente de nós. Se for verdadeira continuaria a ser verdadeira se desaparecêssemos e já era verdadeira antes de pensarmos nela.
Podemos estar enganados ao acreditar que x é uma lei da natureza ou de que A é uma afirmação verdadeira. Mas independentemente das nossas crenças x ou é ou não é uma lei da natureza e A é verdadeira, ou não.
Quando dizemos que uma afirmação ou proposição é contingente ou necessária, não estamos a falar de nós, do estado das nossas crenças, de podermos ou não estar enganados, estamos a falar do modo como as coisas, o mundo, são. A partir daqui só precisamos de aplicar a semântica dos termos “necessário”, “contingente”, “possível”, etc. – Se a água não podia deixar de ser H2O, a proposição é necessariamente verdadeira. Se podia deixar de ser H2O, é contingente, e por aí em diante.
A certeza que atribuímos a uma proposição, por exemplo, é uma noção epistémica. Nada tem a ver com a verdade da proposição em si. Refere-se ao estado dos nossos conhecimentos e crenças. Podemos ter um elevado grau de certeza numa proposição e ainda assim ela mostrar-se falsa. O máximo grau de certeza não torna proposição alguma necessária, nem um grau mediano de certeza a torna contingente. É o mundo que torna as proposições necessárias ou contingentes. A ciência pode enganar-se ao atribuir a x o estatuto de lei da natureza (afinal x nao é uma lei da natureza), mas se x for uma lei da natureza, esta verdade é independente do nosso grau de certeza e dos meios que temos para verificar se x é mesmo uma lei da natureza.
claro que muitas pessoas serão da opinião que não há leis da natureza, tudo são construções ou ficções úteis. É o que em metafísica se chama uma posição “anti-realista”. Estas pessoas tendem a ver as afirmações da ciência apenas como invenções úteis, que funcionam melhor ou pior, mas que nada têm a ver com o modo como o mundo está efectivamente estruturado.
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Vou fazer um comentário sem ter lido os comentários anteriores. Depois vou lê-los com calma.
Desidério
acabei de ler seu diálogo sobre o falsificacionismo e discordei das suas conclusões. Eu não penso que “falsificável” quer dizer apenas “podemos estar enganados”, mas sim que “podemos conceber experimentos ou contra-exemplos capazes de refutar uma conjectura científica”. Se a afirmação “nenhum corpo se movimenta a uma velocidade superior à da luz” é verdadeira, certamente não econtramos nenhum contra-exemplo ou caso empírico que refute essa afirmação. Mas da impossibilidade de encontrar um contra-exemplo nesse caso, pois se trataria de uma verdade fundamental da física, não se segue a impossibilidade de conceber ou propor situações empíricas que seriam um contra-exemplo para essa afirmação. Portanto uma verdade empírica pode ser necessária e falsificável, ao mesmo tempo.
Eu acredito que esse é um dos critérios necessários para distinguir ciência e pseudociência, concordando em parte com Popper nesse caso. Mas não penso que “falsificável” quer dizer apenas “podemos estar enganados”. Aplicando esse princípio no problema da demarcação percebemos como ele é importante. Ele determina a diferença entre ciências como a física e pseudociências como a psicanálise, por exemplo: nas últimas não podemos conceber nenhuma situação capaz de refutar ou testar a teoria, pois a teoria já contem em si mesma resposta pra tudo, incluindo possíveis contra-exemplos. Nas teorias físicasisso não ocorre: podemos passar uma eternidade tentando provar que uma teoria verdadeira é falsa, obviamente sem sucesso, mas ainda assim podemos testar a teoria e é isso que faz toda a diferença.
No que diz respeito à recusa da indução discordo completamente de Popper, mas este já é outro problema.
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Chama-se “pragmatista” à posição que o Miguel está a defender. A ideia é que é irrelevante que uma dada teoria científica seja verdadeira ou não, desde que permita fazer boas previsões. Os positivistas lógicos, que eram quase todos cientistas, tinham tendência para defender algo como isto. Do modo como o Miguel apresenta o pragmatismo, é pura e simplesmente indefensável. Talvez outra versão seja mais plausível, mas esta versão é indefensável, por duas razões.
Primeiro, porque a explicação mais plausível para o grau de previsibilidade de uma teoria é precisamente o seu grau de verdade. Seria bizarro ter uma teoria completamente errada e com um elevado grau de sucesso de previsibilidade.
Segundo, porque a razão pela qual a previsibilidade é tão importante é porque é um guia da verdade. Queremos teorias com um bom poder previsivo porque isso é um indício da sua verdade e porque queremos compreender melhor a realidade, e não porque estejamos apenas interessados nas aplicações da ciência.
Finalmente, note-se que se o falsificacionismo de Popper fosse uma teoria verdadeira, não poderia ter contra-exemplos óbvios. Achei divertido que o Miguel tivesse precisamente a atitude dos astrólogos perante os contra-exemplos: rejeitá-los como contra-exemplos genuínos por não serem do tipo certo.
Uma última nota: chama-se “problema das leis ou condições ceteris paribus” ao que facto de praticamente nenhuma teoria ser completamente precisa, funcionando apenas aproximadamente no mundo real e sempre apenas em determinadas condições. Daqui não se segue que a perspectiva pragmatista da ciência é verdadeira. Segue-se apenas que as teorias científicas estão todas de facto parcialmente erradas. É como a magia dos mágicos: só funciona em certos casos.
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Boa objecção, Matheus. Tome-se uma proposição P. A ideia de Popper seria que essa proposição seria científica se, e só se, a sua falsidade for concebível, no seguinte sentido: podemos imaginar circunstâncias que tornariam P falsa. E a resposta à minha objecção seria que essas circunstâncias não têm de ser realmente possíveis: basta que possamos imaginá-las. Deste modo, P poderia ser necessariamente verdadeira, mas mesmo assim haveria circunstâncias meramente concebíveis, mas não realmente possíveis, que tornariam P falsa. Ao passo que nas pseudociências o palavreado é tipicamente feito de maneira a nem se conseguir saber o que poderia falsificar as suas afirmações cruciais.
Mas mesmo assim não estou convencido, pelo seguinte.
Em primeiro lugar, as pseudociências fazem afirmações perfeitamente falsificáveis, nesse sentido. O que se passa é que os seus partidários reinterpretam sempre o que é afirmado para fugir das objecções. As teorias de Marx e Freud (presumindo como Popper que se trata de pseudociências) permitem fazer previsões, assim como as teorias dos astrólogos e a numerologia. Acontece apenas que os seus defensores são desonestos intelectualmente e sempre que algo parece refutar o que dizem, reinterpretam o que dizem. Não é a própria proposição defendida que é em sim infalsificável; há é uma atitude epistemicamente viciosa de reinterpretação permanente. O que está errado não é P, mas a atitude epistémica perante P. Portanto, parece-me que não é o carácter falsificável de P que demarca as ciências das pseudociências.
Em segundo lugar, não é óbvio que possamos realmente imaginar circunstâncias que falsifiquem P quando P é uma verdade necessária. Depende do que entendemos por conceber ou imaginar. Num certo sentido, não se consegue sequer conceber um planeta no qual a água não fosse H2O, apenas parece que se concebe tal coisa, mas no seio da nossa concepção há uma contradição ou confusão.
Esta segunda resposta não é muito convincente, contudo, e a tua objecção tem muita força — excepto que não é a infalsificabilidade que caracteriza a pseudociência, mas a atitude epistémica dos seus partidários.
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O marxismo gerou previsões que foram falsificadas: que as nações tecnologicamente mais avançadas entrariam em ruptura revolucionária e que o fim do capitalismo se seguiria.
Quando tudo aconteceu ao contrário tratou-se de rever a teoria, fingindo que não se estava realmente a rever a teoria.
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Desidério, aceito qualquer crítica, não sei nada sobre este assunto, só estou a começar a saber destas coisas agora.
Não percebi o facto de uma teoria fazer excelentes previsões e não ser verdadeira. Como é que é possível? Eu disse isso?
Outra coisa, há muitas leis que não têm poder explicativo, apenas prevêm. Há muitas coisas por explicar embora sejam possíveis de prever. Um dos exemplos é a quântica, sabe-se que um eletrão tem uma determinada probabilidade de estar numa certa posição, mas não se sabe porque não vai estar ali. Na física clássica também há montes de exemplos desses.
Também não percebi onde é que tive uma atitude de astrólogo!
Sou mesmo muito pragmático, ainda tenho que suar muito antes de poder entrar nesta discussão. Vou continuar atento.
Miguel Real
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Sim, Miguel: previsão é muito diferente de explicação. Na verdade o pragmatismo caracteriza-se por deitar às urtigas a explicação, e dar apenas atenção à previsão.
A teoria newtoniana permite fazer previsões muitíssimo precisas, mas é literalmente falsa. É isso que significa dizer que se aplica em certas circunstâncias mas não noutras.
(risos) Quanto à atitude de astrólogo: quando se apresenta um contra-exemplo ou um contra-argumento a única resposta racional é fazer como o Matheus: ir directo ao caso e argumentar contra. Quando o Miguel começou a dizer que os meus exemplos não refutam a teoria de Popper, está a fazer como os astrólogos, que perante indícios contrários às suas ideias dizem que são o tipo errado de indícios.
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Ou seja: se a teoria de Popper está certa, todas as afirmações científicas empíricas, para serem científicas, têm de ser falsificáveis. Eu argumentei no diálogo que isso na melhor das hipóteses só se aplica a afirmações contingentes. A única maneira de reagir a isto é negar que a falsificabilidade não possa aplicar-se a afirmações empíricas necessárias, como fez o Matheus, e não alegar que certas afirmações não precisam de ser falsificáveis, apesar de serem empíricas, porque são… do tipo que não precisa de ser falsificável!
Responder
Desidério, eu nunca quis dizer que os seus exemplos não refutam a teoria de Popper porque primeiro eu tinha que percebe-la. O que eu disse é que se calhar não serão os melhores exemplos porque são medições, se fossem leis gerais seria melhor, nada mais.
Quanto à teoria Newtoniana eu só quis dizer que se ela está assim tão errada, então quase todas as outras também estão. Para mim é boa, é a que se usa, apesar de saber as suas limitações.
Miguel Real
Responder
Talvez eu seja um pragmático explicativo porque também dou bastante importância à explicação, que normalmente é o mais difícil.
As leis de Newton para sistemas não relativistas são iguais às da relatividade, por isso não são muito más. Se houvesse alguma lei tão boa nas ciências sociais, seria um enorme passo para elas!
Eu nunca disse que os exemplos do Desidério não refutam a teoria do Popper porque… não a percebo! Eu só queria dizer que poderia ter escolhido exemplos melhores, leis gerais, e não medidas, só queria ajudar.
Por aquilo que li, eu sou o comentador que menos sabe sobre esta discussão, até fiquei envergonhado ao pensar nisso, e arranjei a desculpa de que se o Popper se espetou nesta esta discussão (e não terá sido o único) eu também tenho desculpa, embora isto não me console muito, porque gostava de saber mais sobre o assunto e por isso vou tentar comprar os livros que sugeriu para aprender o que tenho andado a fazer na vida!
Miguel Real
Responder
Nesse caso quase nenhuma teoria, seja ela científica ou não, está errada, porque quase todas são úteis em algumas circunstâncias especiais. O curandeiro mágico parece curar algumas vezes, e a teoria geocêntrica funciona bem para navegar e fazer pontes, a agricultura xamane não deixa as pessoas morrer de fome, e as teorias da conspiração dão emprego e servem de passatempo a muita gente.
Uma teoria errada pode ter consequências verdadeiras em certas circunstâncias e portanto aplicações úteis nessas mesmas circunstâncias. Não é menos errada por isso.
Compreender as ciências — assim como compreender as artes ou a religiões ou o pensamento comum — é muito difícil e é uma das tarefas da filosofia. Do mesmo modo que uma pessoa comum, que evidentemente tem intuições básicas sobre corpos a cair e operações de aritmética, não está melhor qualificada para compreender os aspectos científicos, também os cientistas ou os poetas não estão melhor qualificadas para compreender os aspectos filosóficos das suas actividades. As ideias filosóficas, como as científicas, são inevitáveis; todos as temos. Mas tal como isso não faz de toda a gente cientistas, também não faz de toda a gente filósofos. A filosofia é uma área tão sofisticada da investigação humana quanto as ciências em geral, e é muito mais densa teoricamente do que muitas delas.
Responder
Oi Desidério
penso que você está correto em parte na primeira resposta. De fato a psicanálise e a teoria de Marx possuem consequências falsificáveis, sou obrigado a concordar com você. Mas não penso que isso é uma característica de todas as teorias pseudocientíficas, basta pensar na parapasicologia, por exemplo. Contudo, isso é quase irrelevante como uma resposta à acusão que o critério de demarcação de Popper não funciona. Portanto, resumindo, você está certo.
Quanto à segunda resposta, sobre a concetibilidade metafisica. Só parece difícil conceber que a água não seja H2O, porque você já parte do pressuposto de que a água é H2O. Um contra-exemplo a essa afirmção não seria a descoberta de que “a água que é H2O mas não é H2O”, mas sim que a água não é H2O. Parece difícil conceber isso porque tendemos a pensar que a descoberta seria algo como “a água que é H2O mas nãoé H2O”, mas isso não é necessário.
Para refutar a tese de que nenhum corpo pode atingir uma velocidade maior do que a luz, por exep, basta pensar numa descoberta de um corpocapaz de atingir uma velocidade superior à da luz.
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Usei o termo “necessário” demaneira descuidada no comentário anterior, peço desculpas.
“Parece difícil conceber isso porque tendemos a pensar que a descoberta seria algo como “a água que é H2O mas nãoé H2O”, mas isso não é necessário”.
Com o uso do termo “necessário” queria apenas dizer que isso não é verdade.
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Ah, tens razão. Nada impede quem não sabe se a água é ou não H2O de conceber a hipótese de o não ser.
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“A teoria newtoniana permite fazer previsões muitíssimo precisas, mas é literalmente falsa. É isso que significa dizer que se aplica em certas circunstâncias mas não noutras.”
Isto faz-me confusão. Qual é a teoria que é aplicável fora do seu domínio de validade?
António Passos
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Desidério, eu esqueço-me que você não é físico, vou tentar explicar melhor o que quero dizer.
Na física as leis nunca representam a realidade como ela é, por exemplo na relatividade diz-se que existe um corpo com massa m, etc, e é por isso que depois há choques com a quântica. Os corpos não são um ponto com massa m, são um conjunto de muitas partículas com massa.
Na física há leis que funcionam bem para sistemas não relativistas mas que não funcionam bem quando as coisa têm velocidades altas.
Outra grande divisão que há na física é nas leis que funcionam bem para sistemas macroscópicos e que não funcionam bem para sistemas microscópicos, como nanopartículas.
E porquê? Porque se fazem aproximações à realidade e as coisas nunca são bem assim. Nós estamos tão habituados a isso que nem ligamos!
Por exemplo, nas equações de Maxwell pode assumir-se uma distribuição perfeita de cargas, mas isso não existe, o que existem são cargas pontuais, os electrões, por exemplo, e quando se tentam usar as estas equações para pequenas partículas, como quantum dots, tem que se usar outras coisas porque mesmo 1000 átomos já são poucos para dizer que as coisas são uniformes, como se não houvesse átomos e tudo fosse um contínuo. As equações de Maxwell têm problemas com a nanociência, normalmente mistura-se a quântica para tentar explicar certos fenómenos, e há muitos que estão por explicar.
Há montes de outras leis que funcionam assim, que dizem que há uma área tal, que tem uma distribuição contínua de qualquer coisa, etc. Mas a realidade não é essa. Claro que se fazem essas aproximações e os resultados têm um erro pequeníssimo, muito pequeno mesmo.
Na física usam-se sempre estes truques das aproximações à realidade para se poderem fazer cálculos, senão não se saía do sítio. Mesmo na Quântica fazem-se aproximações deste tipo para poder prosseguir, como considerando que o potencial provocado pelas cargas do núcleo dum átomo (que se considera como um todo, mais uma aproximação) é infinito. Não existem potenciais infinitos, mas é o que se faz! Claro que por vezes pode aumentar-se a precisão, mudar-se as coisas.
É sabido que a gravidade quântica não condiz muito bem com a gravidade prevista pela relatividade, por exemplo, mas não é por isso que se deixa de usar as duas teorias nos casos em que funcionam.
Muitas vezes usam-se aquelas coisas de dizer que um determinado corpo é uma esfera de massa perfeitamente distribuida, por exemplo. Você sabe perfeitamente que não existem esferas perfeitas de massa distribuida continuamente no espaço, é evidente, há átomos, e que nunca estão bem distribuidos, há sempre defeitos nos materiais, mesmo nos cristais mais perfeitos.
Na física funciona tudo assim, escolha a área que quiser e eu dou-lhe exemplos. Na óptica, por exemplo, fazem-se cálculos desprezando certas aberrações, escondendo coisas, para se ir calculando, depois podem fazer-se coisas mais rigorosas, etc. Mas não pense que nós não esquecemos isso, temos perfeita consciência do que fazemos e que o que fazemos é certo, apesar de depois se aprofundar, meter mais um truqe ali, etc.
Se isto lhe parece de curandeiro, olhe, pode parecer, mas dá resultados muito bons, com muitas casas decimais certas, não duvide.
É neste sentido que lhe digo que as leis de Newton estão certas, são como as outras, para certas condições estão certas, e se nós fossemos a usar a relatividade para casos simplíssimos, como calcular a órbita de um satélite, nunca mais saíamos do sítio, e é por isso que fazemos estes truques.
Agora, vôce julgue isso filosóficamente, eu gostava de ouvir a sua opinião, aquilo que sei é que a maioria das leis da física são assim, ou todas, funcionam nuns casos e noutros não, exactamente por muitas vezes não representarem exactamente a natureza, por serem uma aproximação.
Miguel Real
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O que está a dizer aplica-se a todas as teorias: em lógica, física, biologia, química. Praticamente todas as teorias que temos são imperfeitas, mas usamo-las quando não temos teorias melhores; ou quando temos teorias melhores mas não precisamos de pagar o preço pela complicação acrescida que introduzem em situações nas quais funcionam bem as teorias que sabemos estarem erradas. O que pensa o Miguel que se segue daí?
Quem introduziu com muita determinação a reflexão filosófica sobre as cláusulas ceteris paribus das ciências foi Nancy Cartwright, nomeadamente no livro How the Laws of Physics Lie. Uma bibliografia sobre o tema está aqui:
http://www.bris.ac.uk/metaphysicsofscience/bibliographies/laws/ceterisparibuslaws.pdf
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Eu não diria que as leis da ciência mentem ou que estão erradas. Toda a gente sabe o que está a fazer, são aproximações que se fazem. Eu dou-me por contente com a mentira que existe para lá das mais de vinte casas decimais certas que muitas vezes se consegue! Essa mentira para lá das tais vinte casas decimais ofereço-a aos filósofos para poderem reflectirem sobre ela! Se me permite a brincadeia.
Miguel Real
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Vejamos se compreendi: as teorias científicas não estão erradas. Mas não são muito precisas e temos de manipular as coisas cuidadosamente para que funcionem.
Qual é a vantagem de dizer que não estão erradas, se na verdade não podemos aplicá-las sem truques de bastidores? Parece mais honesto dizer que as teorias têm aspectos errados e são incompletas, mas que é o melhor que temos.
Responder
Desidério, eu nunca me debrucei muito sobre o assunto nem nunca li nada sobre esta tema das leis da física mentirem, mas tenho obrigação de saber alguma coisa porque trabalho com elas todos os dias e por isso vou-lhe dar a minha opinião, que não é de especialista nem muito bem pensada. Estive à espera que alguém dissesse algo mas como ninguém contribuiu, aqui vai.
Eu acho que as leis da física não estão erradas, as leis da física são abstrações matemáticas que obedecem às regras e por isso não são falsas, quem é falsa é a natureza, está sempre a falsear-nos!
Dou-lhe um exemplo que acho que é a melhor maneira de explicar as coisas, muito melhor do que conversa enrolada.
Toda a gente sabe que existe uma fórmula para calcular a área de um disco, basta multiplicar pi pelo raio ao quadrado.
Imagine que me pedem para calcular a área de um disco de ouro. Eu pego no paquímetro, meço o diâmetro, faço os cálculos, e entrego o resultado.
Imagine que outro me pede para medir a área de um disco de ouro mas com muito rigor, é para uma experiência não sei quê. Eu pego no paquímetro mais preciso que conseguir arranjar, faço várias medidas, mais umas médias, a seguir puxo de um truque, meto-lhe fractais, e arranjo um valor muito preciso. Se a medida antes era 100,02 mm quadrados, agora passa a ser 100,020004 mm quadrados.
Também pode vir um tarado pedir-me que apure a coisa ao máximo, que isso dos fractais é treta, é só médias, eu que veja bem a coisa. Que é que eu poderia fazer? Meter o disco, tratá-lo durante semanas (só para o limpar completamente!) e depois passar meses num microscópio atómico a mapear toda a área do disco (ninguém faz isto) até saber a posição de todos os átomos do disco e conseguir ter a melhor aproximação possível da área do disco, que desta vez era de 100,02000400003. A partir daí não se poderia ir mais longe porque os átomos estão sempre em movimento e pronto, não se pode fazer nada.
Conclusão: não existem círculos nem linhas rectas na natureza, existem átomos que nunca estão na mesma posição. Mas para a precisão de valores que normalmente interessam, aproximar um disco feito de átomos por uma ideia abstracta que é um disco matemático, perfeito e completamente plano, é suficiente.
É por isso que se usam as fórmulas de Newton para calcular a órbita de um satélite ou para programar um foguetão. Que interessa calcular a órbita usando a relatividade e obtendo um erro inferior a 1 milímetro, na vez de se usar as tais mal afamadas leis Newtonianas que dão um erro de 1 milímetro, se o foguetão vai passar por turbulências na atmosfera que são imprevisíveis, se vai ser ligeiramente afectado por isso e pela imprecisão que existe sempre no funcionamento dos motores, e durante a viagem vai ter que se corrigir a trajectória várias vezes?
Na física usam-se estes truques porque se sabe o que se está a fazer, não há mentiras nem manipulações no sentido mafioso, é tudo muito claro. Se a precisão não é muito importante, deixam-se de lado os trunfos, senão metem-se, até que deparamos com os limites da natureza.
Mas será que há alguma diferença em usar a área de um disco calculado por uma fórmula matemática correcta, mas que não imita perfeitamente a natureza, ou usar a área real (Existe?! Imaginamos que deus nos-la forneceu!) numa experiência em que vamos depositar um tipo de moléculas na superfície desse disco? É que se depois o erro na contagem das moléculas existir, mesmo que pequeno, não nos serve de nada ter o tal valor real da área, se é que isso existe, porque no final o erro da experiência depende de todas as variáveis.
Isto é o que eu acho neste momento, porque como disse nunca reflecti muito sobre o assunto e não me admiraro que venha a mudar de opinião, não estou a par da opinião dos filósofos sobre oassunto e se posso estar errado, apenas quis contribuir e ajudar na discussão.
Miguel Real
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As leis da física não se limitam a “obedecer às regras” (quais regras?). As leis inventadas da física de qualquer livro de ficção também obedecem às regras que o autor estabeleceu. As leis da física pretendem captar a realidade. Fazem-no imperfeitamente. Isso é trivial.
Outra coisa diferente são os limites da nossa capacidade de medição. Isso nem está necessariamente relacionado com as leis da física. Poderíamos ter leis perfeitas, e mesmo assim ser impossível medir certas coisas com uma precisão superior a um dado valor.
A Nancy retira consequências filosóficas do facto referido pelo Miguel de que as leis da física, para poderem ser aplicadas, exigem muitos ajustes ad hoc. Pensei que estava interessado precisamente nisso.
A mim isso não me surpreende. Em lógica ocorre precisamente o mesmo, e é uma disciplina mais precisa e rigorosa do que a física teórica. Na verdade, isto ocorre em qualquer teorização (se ocorre nas teorias mais sofisticadas que temos, então é natural esperar que ocorra também nas outras). A questão é: o que se segue daí? Ainda não entendi o que o Miguel pensa que se segue daí.
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Bom, eu entendo uma coisa que se segue daí: segue-se que a visão infantil que muitas pessoas têm da ciência (a visão de mestre-escola, que eu não me canso de denunciar) é falsa. Mas isso eu digo aos meus alunos quando ensino lógica: todas as teorias humanas são imperfeitas, mesmo quando são muitíssimo sofisticadas e precisas, e todas precisam de muitas manobras ad hoc para funcionar correctamente. Isto significa apenas que a concepção de mestre-escola da ciência (uma coisa muito arrumadinha e perfeita e acabada e nada humana) é falsa.
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Desidério, o que eu queria dizer é que a área de um disco vale pi vezes o raio ao quadrado, é uma fórmula matemática que não é errada, está certa, obedece às regras da matemática. As leis da física são feitas da mesma maneira, sobre conceitos abstractos que têm, ou é suposto terem, um equivalente real. Não é dentro das leis que há manobras ad hoc, ou se há é apenas para facilitar o poder de cálculo, é quando se transpõe as leis abstractas para a natureza real.
Imagino que você tenha razão mas não me peça muito mais sobre o assunto, não sei o que se segue daí, nem percebi muito bem onde quer chegar, eu não sou filósofo!
As ciências perfeitas? Nem pensar, há fenómenos banais que nem se sabe por onde lhe pegar! Mas digo-lhe que nunca conheci professores que escondam aos alunos que as ciências são coisas perfeitas e sem erro, até é um tema que é dado destaque porque é muito importante, e não estou só a falar das medidas mas também das aproximações que se fazem.
Miguel Real
Responder
Se todas as teorias são imperfeitas nem precisamos o Popper para nada, digo eu!
Para mim, a minha definição de lei da ciência é toda a lei que acerte em 100% dos casos para a qual está prevista e com um erro inferior a 10%. Não preciso do falsificacionismo do Popper para nada, e sempre é melhor uma definição mais ciêntífica, em que entram números e tudo! Já lhe dei a ideia, pode publicar aí pelos seus jornais de filosofia!
Estou a brincar!
Miguel Real
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Nesse caso, as leis científicas erradas não são leis científicas. Isso é implausível porque é como dizer que uma má música não é música. Para ser uma má música, tem de ser primeiro música. Analogamente, para uma teoria científica errada ser uma teoria científica errada, tem primeiro de ser uma teoria científica.
A geometria e a matemática são muito diferentes da física; as primeiras não são ciências empíricas, não se descobre as suas leis (um termo aqui inadequado) observando a natureza, mas por mero cálculo. Os matemáticos não precisam de telescópios nem de microscópios nem de laboratórios nem de trabalho de campo.
Por outro lado, que razões poderá haver para pensar que uma teoria está completamente certa, mas depois quando vamos aplicá-la ao mundo, temos de fazer vários ajustes? Com esse tipo de mentalidade qualquer “lei” astrológica está igualmente correcta: é só uma questão de fazer os ajustes necessários.
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Não sei como é que você define má música nem acredito que haja alguma definição para isso, é impossível provar que uma música é má, não me parece uma boa analogia, nem é fácil demostrar coisas com analogias. A filosofia da estética dirá algo semelhante ao que disse, julgo, não estou certo, mas se não diz está errada, eu também sei um bocado de música!
A matemática está tão ligada à física que muitas vezes há novidades no campo da matemática que são introduzidas pelos físicos, e você sabe disso. Também há matemáticos, muitos, que trabalham na física, são áreas muito próximas.
Eu quis explicar-lhe como é que se trabalha em física porque acho que as coisas devem ser ditas com mais rigor e não apenas de uma maneira simplista: as leis de Newton estão erradas. Os seus alunos poderão pensar que afinal estava tudo mal e que os valores que saiam das leis estavam erradíssimos e que a física é uma patranha, quando é o contrário.
Eu trabalho em vários aceleradores de partículas, em vários pontos do mundo, e vejo a relatividade a funcionar ao vivo quando faço determinados procedimentos, mal de mim se não tivesse a relatividade. Mas não vou andar por aí a dizer, as leis de Newton estão erradas, está tudo mal, não as usem. Porque elas são usadas diáriamente e em casos em que estão absolutamente certas. Espero que você explique também isso aos seus alunos, não vão eles cair em erro.
É só isso que queria dizer. Quanto às implicações filosóficas, deixo isso para vocês. Já lhe disse que ainda não percebi qual é a boa teoria filosófica que define bem o que é ciência e o que não é. Existe? Eu tenho a minha maneira de ver as coisas, mas como já lhe disse vou ler os livros que sugeriu, acho muito interessante esta discussão, só que de momento não tenho bagagem para participar nela.
Na minha maneira de ver as coisas não percebo, também, como é que uma teoria astrológica, com os devides ajustes, se pode tornar uma lei científica, fico á espera de exemplos em que a leis astrológicas façam previsões acertadas como as da física, mesmo para casos restritos.
Acho que é melhor ficar por aqui porque não o posso ajudar em mais nada, mas vou ficar atento e continuar a ler o blogue, acho que vocês fazem um trabalho interessante, parabéns, até porque não há muitas coisas como esta escritas em Português.
Miguel Real
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A filosofia não é senso comum. Do mesmo modo que temos boas razões científicas para rejeitar muitas ideias de senso comum, também temos boas razões filosóficas para rejeitar muitas ideias de senso comum. O subjectivismo em estética, que afirma que a beleza está nos olhos do observador, é uma das teorias possíveis, e não é particularmente mais óbvia do que as suas rivais. Mas é natural pensar-se isso hoje em dia antes de qualquer reflexão, tal como é natural pensar que os objectos mais pesados caem mais depressa.
O que está em causa com as leis da ciência é o tipo de critério que se usa para declara que uma lei é verdadeira ou não. Há um critério pragmatista segundo o qual tanto faz se os pormenores não jogam bem entre si, se a aplicação da lei não é universal, se é preciso ajustes para que tudo dê certo: o que conta é que sabemos fazer esses ajustes e pronto!, funciona. Deste ponto de vista, seja o que for que funciona, seja como for, é uma lei científica e não se fala mais nisso. Mas a questão é saber que razão teremos para aceitar esta perspectiva, sobretudo por haver perspectivas alternativas. O provincianismo cognitivo consiste no seguinte: pensar que uma dada ideia é plausível só porque joga bem com o senso comum, porque não conhecemos alternativas e porque nunca nos demos ao trabalho de pensar em alternativas nem em argumentos a favor dessa ideia.
A teoria da gravitação de Newton está errada. Como muitas outras teorias erradas, acerta em casos restritos. Está errada porque não acerta em todos os casos, como declara que acerta. É uma ingenuidade pensar que uma teoria errada dá resultados errados em todos os casos, pois nesse caso nenhuma teoria estaria errada. A teoria geocêntrica serve para fazer muitas coisas, e permite prever os movimentos dos corpos celestes. Segue-se daqui que a teoria está correcta? Se estiver correcta, a Terra está no centro do universo. Mas como noutras teorias igualmente correctas a Terra não está no centro do universo, segue-se trivialmente que a Terra está e não está no centro do universo. Esta é uma das consequências da perspectiva pragmatista: é um relativismo cognitivo difícil de engolir, segundo o qual a Terra em si não está nem deixa de estar no centro do universo, pois tudo depende da teoria que temos em vista.
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Desculpe dizer-lhe, mas se você quiser ser honesto devia mostrar-me a teoria que diz que as Quatro Estações de Vivaldi é melhor do que o Requiem do Mozart ou do que o Something dos Beatles. Porque essa não existe, como é evidente, e não venha enrolar a conversa, nem me traga para aqui teorias que não são óbvias, quando fizer afirmações faça-as com segurança e certeza, que é o que eu faço, quando sei, sei, quando não sei, calo-me.
Acho que é esta a maneira correcta de discutir um assunto, porque eu não estou aqui para ganhar nada, apenas por prazer.
Miguel Real
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Na verdade, não são muitos os filósofos que defendem que é inteiramente subjectivo dizer que uma obra de arte é melhor ou pior do que outra. A defesa mais brilhante de algo como isso é o famoso ensaio Of The Standard of Taste de Hume, mas ele defende que mesmo assim a avaliação das obras de arte não é subjectiva, num sentido robusto do termo. E muitos filósofos defendem a objectividade da avaliação estética, de um modo ainda mais robusto do que Hume.
Este é um caso em que as intuições das pessoas são muitíssimo influenciadas pelo seu tempo histórico; e no nosso tempo as pessoas tendem a pensar, por várias razões, nenhuma delas boa, que tudo é relativo no que respeita “aos valores”. A parte IV do livro Introdução à Estética, de Dickie (Bizâncio) é um bom ponto de partida para este tema.
Frank Sibley, por exemplo, defende hoje em dia uma teoria objectivista, segundo a qual os juízos de valor estético são perfeitamente susceptíveis de ser objectivos (ainda que não o sejam muitas vezes, mas isso ocorre com quaisquer outros juízos: as pessoas avaliam as coisas à balda na maior parte das vezes, seja com respeito às artes seja com respeito à queda dos corpos e é isso que as faz pensar que os objectos mais pesados caem mais depressa).
Mas a discussão não era sobre arte, mas sobre ciência. E a questão é entender o que poder querer dizer a ideia surpreendente de que nenhuma teoria científica está errada, e que tudo o que conta para que uma teoria seja científica é funcionar razoavelmente em certas condições. O contra-exemplo apresentado a esta ideia ainda não foi enfrentado.
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Então digo-lhe que esses filósofos têm muito que aprender. Aposto com quem quiser apostar comigo que não há nenhuma teoria objectiva que afirme sem a mínima dúvida que as Quatro Estações são melhores do que o Requiem ou do que o Deixa Cheirar O Teu Bacalhau Maria. Quer uma aposta comigo? Escolha a quantia, para mim qualquer valor serve. Moster-me lá a tal teoria em que as notas são introduzidas e o computador dá pontuação, porque imagino que seja algo do estilo, muito objectivo, muito melhor do que as leis de Newton. Porque os filósofos são muito bons em definições, ou não?
Já lhe disse como funciona a física e não afirmei que as leis de Newton não estão erradas, não insista, só lhe disse que devia explicar isso melhor. Já lhe disse que há outros exemplos que funcionam de maneira parecida para certas situações e que há teorias que apenas prevêm sem explicar. E ninguém esconde nada desses pormenores.
Sobre o que é uma lei da ciencia e se está certa ou errada, fico á espera da resposta dos filósofos, já lhe disse que tenho que ler mais sobre o assunto. Mas se a resposta for tão boa e tão objectiva como é a resposta sobre a estética, ficarei muito desiludido.
Não se esqueça da aposta e escolha um valor alto.
Miguel Real
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Nesse sentido de objectivo, nem partes substanciais da lógica formal é objectiva, porque não é decidível por uma máquina de Turing. Caso em que as teorias da física também não seriam objectivas. Logo, do facto de uma máquina de Turing não poder decidir se Mozart é melhor do que os U2 é irrelevante.
Os filósofos são tão bons em definições quanto os cientistas ou outros profissionais, pela simples razão de que nenhuma actividade relativamente sofisticada é possível sem definir conceitos cruciais. Os matemáticos definem limite, os físicos massa e os biólogos linhagem. Os carpinteiros e pedreiros e padeiros definem também termos centrais das suas actividades, tal como os juízes termos centrais do direito.
Quanto à ciência, podemos então aceitar que há teorias científicas falsas. O que significa que o que há de científico nas teorias científicas não pode simplesmente ser o facto de serem verdadeiras. Resta saber se o que faz de uma teoria uma teoria científica é simplesmente o facto de fazer previsões correctas. Esta ideia também não é plausível porque significaria que qualquer teoria que fizesse previsões incorrectas, não seria científica. Dado que muitas teorias científicas abandonadas ao longo da história o foram precisamente por fazerem previsões incorrectas em certos casos, seguir-se-ia que nenhuma dessas teorias era genuinamente científica, o que é implausível.
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“Miguel Real”, “tinoni”, ou… “luis”:
Acabou a peixeirada, os “já lhe disse” e os sarcasmozinhos. Isto não é o bacalhau da Maria.
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jh
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